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Da Itália, um produto que virou tipicamente brasileiro
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Uma tradição italiana que, ao vir para o Brasil, se adaptou e se tornou um produto único no mundo. O socol é um embutido que pode ser usado como metáfora para a história dos imigrantes que chegaram no Espírito Santo, se estabeleceram nas montanhas capixabas e se moldaram aos costumes brasileiros.
O produto é derivado de outro muito consumido na Itália, o ossocollo. Ambos são feitos de carne de porco: o de lá, do pescoço do animal, rico em gordura; o daqui, do lombo, uma parte bem mais magra e de maior aceitação. O socol tem desde 2018 o selo de identidade geográfica (IG), como indicação de procedência, destacando a tradição e qualidade do produto feito no noroeste do município de Venda Nova do Imigrante.
Uma singularidade do produto feito na região é um fungo encontrado ali, que no caso do socol é essencial para maturar a carne. “A região de Venda Nova do Imigrante foi protegida porque só aqui acontece essa mágica, esse processo de socolização”, explica Alexandre Cesquim, presidente da Associação de Produtores de Socol local.
A família de Thais Falqueto faz artesanalmente o socol da marca Tio Vé, nome que vem do apelido do pai dela, Elvécio. O lombo do porco fica três dias na salmoura, depois é envolto numa membrana chamada peritônio e, em seguida, é pendurado para maturar por meses. “Isso vem da tradição da família da minha avó, por parte de pai, era a forma de conservar a carne. Nós continuamos essa tradição de mais de 130 anos”, diz a produtora.
A produção só é feita entre maio e outubro, os meses mais frios do ano. Apenas nesse período se desenvolve o fungo benéfico para o embutido, que deixa a maturação da carne mais lenta, mas não causa nenhum odor ou sabor, por causa da membrana que o protege. “O fungo verde, às vezes o fungo branco, é benéfico para o socol. Já o fungo amarelado altera o sabor, o que acontece no verão”, conta Thais.
Rota gastronômica
Há dez anos, a família abriu o negócio que, além do socol, inclui uma cafeteria e adega. Um tipo de atrativo que é visto entre outros produtores: além da produção do socol, muitos mantêm também uma loja na propriedade, onde o visitante pode conhecer quem faz e saber mais da história e tradição da família. Isso fez com que a região de Venda Nova do Imigrante virasse uma rota gastronômica para quem passa pelas montanhas capixabas, onde há também cafés e restaurantes especializados.
Uma das pioneiras no agroturismo da região é a família Carnielli, que viu a oportunidade de ampliar as vendas a partir do socol. O produtor Lorenzo Carnielli lembra que quando era criança, os turistas perguntavam por mais produtos: queriam levar café, queijo e fubá para fazer polenta. “Hoje, a gente tem socol, linguiça, queijos, doce de leite, cafés especiais das montanhas do Espírito Santo e, aos poucos, a experiência ficou completa”, afirma.
Lorenzo é da nova geração de produtores de socol. Assim como muitos jovens, saiu da cidade para estudar, com outros sonhos. Mas resolveu voltar e aplicar o que aprendeu como engenheiro de produção na propriedade da família. Implantou uma mini usina hidrelétrica, a partir das quedas d’água que existem no local. “Já geramos 70% da energia elétrica que consumimos na fazenda”, diz.
Na família Angelim, foi Karla que quis conhecer o mundo fora de Venda Nova do Imigrante. Foi para Vila Velha, fez faculdade de economia, se casou, mas depois sentiu falta das origens e da família. “Sempre tive vontade de levar para a frente nossa história, dos nossos nonos, do meu pai, isso me dá muita alegria”. Esse sentimento é passado para a marca da família, que tem como slogan da Angelim Socol “um pedaço da nossa história”.
O marido de Karla, Alexandre Cesquim, é o presidente da associação local que reúne oito produtores, dos quais seis já têm o direito de utilizar o selo da IG por obedecer padrões de qualidade. “A IG anda de mão dada com a cultura, se você não tiver história, a IG não reconhece a notoriedade”, explica. Ele afirma que o selo trouxe fama ao produto: “quando as pessoas têm essa referência, já dizem ‘eu vou lá em Venda Nova visitar o agroturismo do município e vou também atrás do socol’, o que agregou mais valor a ele”.
Novas oportunidades
Junto com o roteiro gastronômico, outras atividades se desenvolveram com a demanda do próprio turismo. O empresário Ricardo Girardi viu isso acontecer: “nos últimos dez anos, está havendo essa migração da agricultura familiar para o turismo, até com a ajuda do Sebrae, o Serviço Brasileiro de Apoio à Micro e Pequena Empresa”. Com essa expansão, ele viu a oportunidade de criar o Ecoparque Pedra Azul Aventura, que oferece passeios com quadriciclos, a hospedagem em chalés e camping.
O local do ecoparque é estratégico, na rota do Lagarto, de onde é possível contemplar três parques: Pedra Azul, Forno Grande e Pico da Bandeira. Ricardo também foi estudar fora e voltou, mas acredita que agora o cenário é diferente para as próximas gerações. “Com os restaurantes, cafés gourmets, reconhecidos em todo o Brasil, acabou um pouco desse processo de os filhos saírem, porque estão surgindo várias atividades na região”, conclui.
O programa Caminhos da Reportagem vai ao ar neste domingo (27), às 22h, na TV Brasil.
Edição: Graça Adjuto
Fonte: EBC Geral


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Prefeitura de SP constrói muro na Cracolândia para isolar área de usuários de drogas
A Prefeitura de São Paulo ergueu um muro na Cracolândia, localizada no Centro da cidade, com cerca de 40 metros de extensão e 2,5 metros de altura, delimitando a área onde usuários de drogas se concentram. A estrutura foi construída na Rua General Couto Magalhães, próxima à Estação da Luz, complementada por gradis que cercam o entorno, formando um perímetro delimitado na Rua dos Protestantes, que se estende até a Rua dos Gusmões.
Segundo a administração municipal, o objetivo é garantir mais segurança às equipes de saúde e assistência social, melhorar o trânsito de veículos na região e aprimorar o atendimento aos usuários. Dados da Prefeitura indicam que, entre janeiro e dezembro de 2024, houve uma redução média de 73,14% no número de pessoas na área.
Críticas e denúncias
No entanto, a medida enfrenta críticas. Roberta Costa, representante do coletivo Craco Resiste, classifica a iniciativa como uma tentativa de “esconder” a Cracolândia dos olhos da cidade, comparando o local a um “campo de concentração”. Ela aponta que o muro limita a mobilidade dos usuários e dificulta a atuação de movimentos sociais que tentam oferecer apoio.
“O muro não só encarcerou os usuários, mas também impediu iniciativas humanitárias. No Natal, por exemplo, fomos barrados ao tentar distribuir alimentos e arte”, afirma Roberta.
A ativista também denuncia a revista compulsória para entrada no espaço e relata o uso de spray de pimenta por agentes de segurança para manter as pessoas dentro do perímetro.
Impacto na cidade
Embora a concentração de pessoas na Cracolândia tenha diminuído, o número total de dependentes químicos não foi reduzido, como destaca Quirino Cordeiro, diretor do Hub de Cuidados em Crack e Outras Drogas. Ele afirma que, em outras regiões, como a Avenida Jornalista Roberto Marinho (Zona Sul) e a Rua Doutor Avelino Chaves (Zona Oeste), surgiram novas aglomerações.
Custos e processo de construção
O muro foi construído pela empresa Kagimasua Construções Ltda., contratada após processo licitatório em fevereiro de 2024. A obra teve custo total de R$ 95 mil, incluindo demolição de estruturas existentes, remoção de entulho e construção da nova estrutura. A Prefeitura argumenta que o contrato seguiu todas as normas legais.
Notas da Prefeitura
Em nota, a administração municipal justificou a construção do muro como substituição de um antigo tapume, visando à segurança de moradores, trabalhadores e transeuntes. Além disso, ressaltou os esforços para oferecer encaminhamentos e atendimentos sociais na área.
A Secretaria Municipal de Segurança Urbana (SMSU) reforçou que a Guarda Civil Metropolitana (GCM) atua na área com patrulhamento preventivo e apoio às equipes de saúde e assistência, investigando denúncias de condutas inadequadas.
A questão da Cracolândia permanece um desafio histórico para São Paulo, com soluções que, muitas vezes, dividem opiniões entre autoridades, moradores e ativistas.