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Vocação: o chamado que resiste ao mundo

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Por Orlando Morais Jr

Vivemos dias em que as fundações do mundo parecem abaladas. A linguagem já não expressa o real, mas o disfarça. A verdade tornou-se objeto de disputa entre ideologias. A religião, antes farol que iluminava os povos, hoje se vê envolta em escândalos, tibieza e corrupção doutrinal.

O Brasil, ferido por um analfabetismo funcional que corrói o juízo, vê seus governantes entregues ao deboche das leis e à servidão ideológica de agendas estrangeiras. E o mundo, desorientado e exausto, dobra os joelhos não diante de Deus, mas de instituições que usurpam o nome da humanidade para impor sua tirania disfarçada de consenso.

É precisamente neste cenário — e por causa dele — que urge proclamar com clareza o que verdadeiramente significa vocação.

A vocação não é um capricho da vontade, nem o fruto de aptidões naturais. Ela não se reduz a profissão, nem a projeto de vida. A vocação é, em sua essência, um chamado do alto — um sopro que vem de Deus, uma convocação secreta e profunda que toca a alma e a impele a ocupar o lugar que lhe é devido na grande ordem do cosmos.

Cada ser humano nasce com uma configuração única. Sua estrutura íntima, sua sensibilidade, suas potências, seus dons — tudo aponta para uma forma particular de serviço. Descobrir a vocação é, pois, reconhecer esta forma e obedecer-lhe. É encontrar o próprio nome inscrito na vontade divina e dizer “sim”.

Em um tempo de dissolução como o nosso — onde tudo é fragmentado, líquido, transitório — a vocação se apresenta como um eixo silencioso e invencível. Quem lhe responde torna-se resistência espiritual contra a mentira universal. Enquanto o mundo opera pela lógica da dissolução — dissolução da linguagem, da identidade, da verdade —, o vocacionado testemunha, com a própria vida, que há uma ordem, um princípio, um destino e um bem.

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Ao mesmo tempo, essa resposta confere ao homem uma reintegração interior: ele já não vive ao sabor das forças dispersivas que o cercam, mas adquire um centro. Sua alma torna-se coesa, sua inteligência, lúcida, e sua presença, pacificadora.

A vocação não o isola do mundo, mas o planta profundamente nele, como presença restauradora. Onde passa, ele reata os vínculos rompidos pela desordem, faz florescer o sentido onde tudo parecia deserto, reacende símbolos apagados, reconduz realidades à sua forma natural. Tal homem, ainda que desconhecido aos olhos da multidão, opera uma reforma invisível e silenciosa. E tudo o que toca — palavras, gestos, obras — carrega o sinal do bem. Pois aquele que vive sua vocação não apenas realiza-se: ele cura.

A história de Santo Ambrósio é, neste sentido, luminosa. Cônsul e administrador romano, homem de cultura e temperança, ele ainda era catecúmeno quando foi chamado a apaziguar um conflito entre cristãos em Milão. Sua fala firme e justa encantou o povo. Subitamente, como por inspiração do alto, a multidão começou a clamar: “Ambrósio, bispo!”

Ele resistiu. Tentou ocultar-se. Implorou que não o escolhessem. Mas a vontade do povo, unida ao desígnio de Deus, o constrangeu. Foi batizado, ordenado e consagrado em poucos dias. E transformou-se num dos maiores doutores da Igreja, mestre de Santo Agostinho e defensor intrépido da fé contra imperadores e heresias.

Essa história ensina uma verdade esquecida: a vocação não é uma escolha pessoal, mas uma resposta amorosa à verdade de si mesmo, que nem sempre se enxerga de imediato. Muitas vezes, o chamado se apresenta revestido de temor, desconforto ou combate interior — mas é precisamente nesse desconcerto inicial que repousa o selo da autenticidade. Pois o que é dado por Deus não visa agradar à carne, mas purificar a alma.

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A vocação, quando assumida, torna-se também um gesto de amor concreto. Ela é doação de si, oblatividade silenciosa, sacrifício voluntário. O vocacionado não busca os favores do mundo, nem se inquieta com sua própria realização — pois compreendeu que a verdadeira alegria está em servir ao bem que o excede. Tal homem, mesmo quando calado, ensina. Mesmo quando combatido, edifica. Mesmo quando ferido, fecunda.

Em tempos como os nossos, em que tudo se desfaz e se inverte, viver a própria vocação é um ato de fidelidade à estrutura invisível do real. É manter-se vinculado a um centro que não gira com o mundo. É tornar-se, no silêncio dos dias, sinal de uma ordem que ainda pulsa sob o caos.

A vocação não livra o homem do sofrimento, mas o insere no sofrimento redentor. Não o poupa da luta, mas dá à luta um sentido. Não o arranca do mundo, mas o planta no mundo como testemunha de outra realidade — uma realidade que não passa, porque está fundada em Deus.

E talvez ressoe aqui o que Friedrich Schelling viu com espantosa clarividência: que a história do mundo é, em sua essência, o processo pelo qual o Absoluto se revela, e que cada homem, ao responder à sua vocação mais alta, torna-se lugar da Revelação. Pois é no interior das almas que Deus deseja manifestar-Se plenamente. A vocação, portanto, não é apenas caminho de plenitude pessoal: é participação consciente no desvelamento do próprio Ser.

Responder ao chamado é, então, mais do que obedecer a uma inclinação: é permitir que a luz eterna encontre forma no tempo — e que, por meio de nós, o invisível se torne visível, e o eterno, presença viva no mundo.

ORLANDO MORAIS JR é jornalista e filósofo.

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Impactos da LGPD nas relações de trabalho e empresariais

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Por Dauto Passare

A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), Lei nº 13.709/2018, trouxe mudanças significativas para a proteção de dados pessoais no Brasil, influenciando diretamente as relações trabalhistas e práticas empresariais.

Antes da LGPD, o tratamento de dados pessoais dos empregados era realizado de forma ampla e pouco regulamentada, muitas vezes sem clareza quanto ao seu uso. Com a vigência da lei, tornou-se obrigatória a adoção de mecanismos claros e transparentes para coleta, armazenamento, compartilhamento e exclusão de dados pessoais.

Nesse contexto, a LGPD estabelece princípios fundamentais como finalidade específica, necessidade, transparência e consentimento (artigo 6º, LGPD), exigindo que empregadores revejam contratos, regulamentos internos e práticas de gestão de pessoas.

Um desafio relevante refere-se ao monitoramento dos empregados. A LGPD exige que empresas revejam suas práticas de vigilância e monitoramento eletrônico, limitando a coleta de dados ao estritamente necessário e justificado para finalidades específicas, como segurança ou produtividade, sob pena de sanções administrativas ou jurídicas.

Do ponto de vista ético, a implementação da LGPD nas relações trabalhistas reforça a dignidade e privacidade do trabalhador. Ao definir claramente os limites para coleta e utilização de informações pessoais, a lei protege o empregado de potenciais abusos decorrentes da manipulação indiscriminada de dados.

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Juridicamente, a LGPD trouxe maior clareza e segurança às relações trabalhistas ao definir responsabilidades claras para empregadores e direitos específicos para empregados quanto ao acesso, correção e exclusão de seus dados pessoais, conforme os artigos 17 e 18 da lei. As empresas precisam assegurar a conformidade, criando políticas internas robustas e oferecendo treinamento contínuo para evitar riscos legais e financeiros.

A figura do encarregado pelo tratamento de dados pessoais (DPO – Data Protection Officer) tornou-se fundamental após a LGPD. Esse profissional tem a responsabilidade de supervisionar a conformidade das práticas empresariais, garantir o cumprimento das normas, orientar empregados e gestores sobre práticas adequadas de tratamento de dados e servir como canal de comunicação com a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD).

O DPO deve garantir que os processos de tratamento sejam documentados, auditáveis e alinhados aos princípios legais da proteção de dados, tornando-se um elemento essencial nas estratégias empresariais relacionadas à gestão de dados pessoais dos empregados.

O não cumprimento das exigências da LGPD pode gerar consequências significativas, que vão desde sanções administrativas impostas pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), como multas (artigo 52, LGPD), até processos judiciais trabalhistas por parte dos empregados cujos dados pessoais tenham sido tratados indevidamente.

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Além das consequências jurídicas e financeiras, há o risco de danos reputacionais significativos para as empresas. A exposição pública relacionada a incidentes envolvendo a má gestão de dados pessoais pode gerar perda de confiança e impacto direto na imagem das organizações no mercado.

Compreender e aplicar corretamente a LGPD torna-se essencial para o sucesso das organizações, reforçando o compromisso ético e responsável das empresas com seus funcionários e com a sociedade.

 

DAUTO PASSARE é advogado e professor universitário

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