BRASIL
Brasília, 63: novos candangos madrugam e sonham no centro comercial
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– Vamos comer, vamos comer. Já é meio-dia. Bora, Brasília.
A chamada é um grito no meio da multidão, que não são todos que podem obedecer. Não é por falta de fome. No centro comercial da capital, na Asa Sul, trabalhadores acordaram bem cedo, antes do céu se acender. Por uns sonhos, por uns reais, por todas as realidades que os cercam. O horário é o de menos. Não dá para parar. O cliente chegou. Os novos candangos estão no “corre”.
Que o diga o brasiliense João Wellington Batista, de 42 anos, motociclista de aplicativo, na ansiedade do próximo som do celular, que avisa qual será a próxima entrega. Nem o dedo enfaixado que ele lesionou, lavando a “bicha” (a companheira moto) com o motor ligado, faz com que ele dê um tempo do “trampo”. “Nem pensar dá pra parar. Tenho um filho de 13 anos para cuidar”. Na rotina, sai de Samambaia, a 30 km dali, antes das 6h da matina. Só volta para casa depois da meia-noite o filho de pais de Uberaba (MG) e Goiânia (GO).
Ele já passou por outros apertos. Joelho arranhado, bacia machucada. “Foram três acidentes nesses últimos tempos. O trânsito dá medo mesmo”. Mas não teve muita opção, desde que, em 2015, perdeu o emprego de porteiro, o último com carteira assinada. Ao lado de sua moto, outras aceleram ao primeiro som do celular. Os novos candangos estão em meio a uma mistura de barulhos.
Mistura também de cheiros e gostos. “Olha o churrasquinho. Quentinho. Vamos almoçar”. Mas ainda não é pro bico de Nathan Santiago, de 23 anos, que só vai poder montar a marmita depois das 14h30. Agora, tem que servir os outros. A fumaça que sai das churrasqueiras sobe para o nariz e para os olhos, embalada pelo clima seco da capital.
Nathan sai cedinho de Planaltina, a quase 60 km do centro. Tudo vale a pena. Sonha fazer um curso superior em gestão de pessoas. Junto com ele, está no caixa do churrasquinho Sávio Silva, de 20, também planaltinense. “É uma correria difícil”. Menos difícil, segundo ele, do que a aventura por qual passou o pai carpinteiro, que saiu de Floriano (PI) para tentar a vida na capital. Hoje deseja mesmo fazer faculdade de administração. Enquanto pensam no futuro, ambos de máscara, só tiram do rosto para tomar água em uma garrafa que já foi de refrigerante.
Almoçar também não é a prioridade do goiano Fábio Araújo, de 40 anos, que está no outro lado da rua. Aliás, o comerciante administra dois negócios ao mesmo tempo: os docinhos em cima de uma mesa de plástico e a cadeira de engraxate. Foi lustrando os sapatos alheios que ele começou essa aventura de comércio de rua há 16 anos. Para complementar renda, resolveu juntar paçocas, balas e bananada para ter mais moedinhas no final do dia. Qual vale mais a pena? “Os dois. Importa que eu leve dinheiro para casa”.
A casa fica em Luziânia, a 60 km dali, o que faz com que ele desperte todos os dias às 4h da manhã para chegar ao centro de Brasília, às 7h. Afinal, a prioridade, nesse momento, é o tratamento do filho mais velho, de 18 anos, que foi diagnosticado com lúpus. Além dele, tem mais três filhos que precisam da atenção do pai. Todos na casa sonham um dia ter uma casa própria. “E saúde, para eu continuar trabalhando”. A esposa também madruga. Faz dindim caseiro para vender em Luziânia.
Entre as clientes dos docinhos de Fábio, a pernambucana Aline dos Santos, de 22 anos, que trabalha como auxiliar de serviços gerais em uma empresa do centro, comemora ter registro em carteira.
Tal e qual sonharam os pais, um pintor e uma empregada doméstica, desde quando saíram de Arcoverde (PE) para se instalar em Ceilândia, a maior região administrativa do Distrito Federal e que tem 60% da população, cerca de 140 mil pessoas nascidas no Nordeste. Outros 130 mil são descendentes diretos de pais daquela região.
Aline entra no serviço às 7h, o que faz com que madrugue no ônibus. “Sonho estudar mais e passar em um concurso da polícia”. Mas ainda precisa recuperar o tempo passado e terminar o ensino médio.
História de exclusão
Sonhos legítimos, apagamentos da história de trabalhadores da capital, reações sociais…. Para o historiador Guilherme Lemos, a Brasília do ano de 2023 guarda caminhos de segregação e racismo, como ocorreram desde a sua construção.
Ele cita um episódio ocorrido em abril de 1962, quando os trabalhadores Gildemar Marques, de 19 anos, nascido em Bom Jesus (PI), e Expedito Xavier Gomes, de 27, de Ipu (CE) morreram em um canteiro de obras da Universidade de Brasília. O fato foi também objeto de pesquisa de doutorado de Guilherme Lemos na tese “No dilacerar do concreto (leia aqui). Saiba também sobre as providência da Justiça do DF para reparação das famílias das vítimas”.
Em “homenagem” às vítimas, o auditório da universidade ganhou o nome de “Dois Candangos”, e não o nome deles.”A minha questão era justamente como que esse nome candangos acabou apagando essa história do Brasil”, explicou.
O pesquisador chama atenção que se trata da história de uma segunda geração de trabalhadores de um Brasil pós-abolição. O concreto da obra serviu, então, conforme o pesquisador, com a monumentalização que é Brasília, para ocultar esse passado do Brasil escravista. Um Brasil teoricamente disposto a não tratar do passado e até a escondê-lo.
“Essa monumentalização gera um apagamento da memória desses homens. Um passado que é de violência e romantização na tentativa de esquecimento”.
“Vim como mucama”
No presente da capital, o centro comercial traz histórias de recomeço. Como é o caso da ambulante Silvana Alves, de 43 anos, que vende roupas em uma barraca. Ela, que é da cidade de Piracuruca (PI), mudou sozinha para Brasília há cerca de 25 anos. “Vim para cá com menos de 18 anos de idade como mucama para fazer serviços domésticos. Não deu para estudar. Desde criança, vivia na roça. Hoje, consigo ajudar minha mãe que continua lá. Vou a São Paulo periodicamente para comprar os vestidos, blusas e casacos para ganhar alguma coisa”.
Na Feira do Pedregal, no Novo Gama, ela conheceu o marido Rubens Martins, de 31 anos, que vendia bijuterias, e nasceu em Niquelândia (GO). Resolveram juntar as esperanças e os varais de produtos. “Somos dois candangos”, diz ela.
De frente à barraca de roupas, três pessoas estão em volta de uma caixa de isopor com marmitas: Thaynara Alves, de 34, o marido Wender Soares, de 49, que também é taxista, e a filha de cinco meses. “Ela é a única que não pode ficar sem comer. A gente consegue”, diz Thaynara, que sonha mesmo ser profissional de saúde.
Hoje, ela cursa enfermagem à noite, perto de onde mora, em Luziânia (GO). Procura voltar rápido para casa de forma que o marido possa descansar. Afinal, atende os clientes a partir das 3h da manhã. “O meu filho mais velho me jurou que vai fazer faculdade para realizar meu sonho. Queremos o mesmo para a nossa bebê, que ela goste de viver aqui”, explicou.
Fonte: EBC GERAL


BRASIL
Prefeitura de SP constrói muro na Cracolândia para isolar área de usuários de drogas
A Prefeitura de São Paulo ergueu um muro na Cracolândia, localizada no Centro da cidade, com cerca de 40 metros de extensão e 2,5 metros de altura, delimitando a área onde usuários de drogas se concentram. A estrutura foi construída na Rua General Couto Magalhães, próxima à Estação da Luz, complementada por gradis que cercam o entorno, formando um perímetro delimitado na Rua dos Protestantes, que se estende até a Rua dos Gusmões.
Segundo a administração municipal, o objetivo é garantir mais segurança às equipes de saúde e assistência social, melhorar o trânsito de veículos na região e aprimorar o atendimento aos usuários. Dados da Prefeitura indicam que, entre janeiro e dezembro de 2024, houve uma redução média de 73,14% no número de pessoas na área.
Críticas e denúncias
No entanto, a medida enfrenta críticas. Roberta Costa, representante do coletivo Craco Resiste, classifica a iniciativa como uma tentativa de “esconder” a Cracolândia dos olhos da cidade, comparando o local a um “campo de concentração”. Ela aponta que o muro limita a mobilidade dos usuários e dificulta a atuação de movimentos sociais que tentam oferecer apoio.
“O muro não só encarcerou os usuários, mas também impediu iniciativas humanitárias. No Natal, por exemplo, fomos barrados ao tentar distribuir alimentos e arte”, afirma Roberta.
A ativista também denuncia a revista compulsória para entrada no espaço e relata o uso de spray de pimenta por agentes de segurança para manter as pessoas dentro do perímetro.
Impacto na cidade
Embora a concentração de pessoas na Cracolândia tenha diminuído, o número total de dependentes químicos não foi reduzido, como destaca Quirino Cordeiro, diretor do Hub de Cuidados em Crack e Outras Drogas. Ele afirma que, em outras regiões, como a Avenida Jornalista Roberto Marinho (Zona Sul) e a Rua Doutor Avelino Chaves (Zona Oeste), surgiram novas aglomerações.
Custos e processo de construção
O muro foi construído pela empresa Kagimasua Construções Ltda., contratada após processo licitatório em fevereiro de 2024. A obra teve custo total de R$ 95 mil, incluindo demolição de estruturas existentes, remoção de entulho e construção da nova estrutura. A Prefeitura argumenta que o contrato seguiu todas as normas legais.
Notas da Prefeitura
Em nota, a administração municipal justificou a construção do muro como substituição de um antigo tapume, visando à segurança de moradores, trabalhadores e transeuntes. Além disso, ressaltou os esforços para oferecer encaminhamentos e atendimentos sociais na área.
A Secretaria Municipal de Segurança Urbana (SMSU) reforçou que a Guarda Civil Metropolitana (GCM) atua na área com patrulhamento preventivo e apoio às equipes de saúde e assistência, investigando denúncias de condutas inadequadas.
A questão da Cracolândia permanece um desafio histórico para São Paulo, com soluções que, muitas vezes, dividem opiniões entre autoridades, moradores e ativistas.
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